sexta-feira, abril 23, 2010

Sobre o envelhecimento

Nos tempos que correm, vivo neste mundo «inimaginável». Isso confere-me um enorme sentimento de estranheza, e não sei ao certo se me considero um homem feliz. Se calhar, a questão também não importa assim tanto quanto isso. Envelhecer representa para mim - e, provavelmente, para toda a gente - uma experiência pioneira, e as emoções que me invadem são, também elas, novas. Se estivéssemos a falar de uma coisa que eu tivesse experimentado antes, estaria em condições de compreender melhor a situação, mas como é a primeira vez, nada a fazer. Por agora, deixarei para mais tarde a capacidade de exercer todo e qualquer juízo concreto e, por isso, resta-me aceitar a vida como ela é. (...)

Haruki Murakami "Auto-retrato do escritor enquanto corredor de fundo"

quarta-feira, abril 21, 2010

Um bocadinho mais de coerência, sff...

Estive fora e deparei-me hoje com a quantidade de alarvidades que se vão dizendo por aí a propósito da tolerância na altura da visita do Papa. Quando soube da notícia, insurgi-me contra a medida: eu, pecadora, me confesso. Pasmem-se: uma católica assumida, (equiparada a) funcionária pública (ou pelo menos com alguns dos seus direitos) contra a tolerância durante a visita do Santo Padre a Portugal.

O argumento da laicidade do Estado, para mim, é válido.  Mais: o Estado é laico e deve continuar a sê-lo (não, não vou morrer na fogueira, nem estou a dizer nenhuma heresia).

Mas custa-me. Custa-me que dirigentes sindicais que estão constantemente a apregoar que a produtividade não pode ser argumento para tudo, que as empresas não podem ser produtivas a qualquer custo, me apareçam com o argumento da produtividade para demonstrarem a sua opinião. Custa-me que de repente os argumentos para aquilo que defendo sejam tão básicos, quase baixos.

Sim, considero que se quiser assistir à missa em Fátima, ou em Lisboa, ou no Porto (porque até isso eu não entendo, por alma de quem é que só tenho tolerância no dia 13 por trabalhar em Cantanhede) devo meter férias. Mas de repente aparecem meia dúzia de fundamentalistas, uns que querem distribuir preservativos à porta da Missa (eh pá, distribuam lá o que quiserem, se pensam que ganham alguma coisa com isso) outros que acham escandaloso que o Presidente da República queira acompanhar o Papa - como se não tivesse esse direito, como cidadão e como representante dum país de maioria católica.

Combatam livremente, mas com consciência. Sejam coerentes. Tolerância, meus senhores. Chama-se tolerância.

Norwegian Wood, Haruki Murakami

A perda, a morte, as lembranças. Watanabe é um jovem estudante que vai viver para Tóquio numa altura em que a luta estudantil fervilhava um pouco por todo o mundo na década de 60. Solitário, como todas as personagens de Murakami, narra a sua história cheia de solidão e sexualidade - não querendo parecer pudica, é um lado talvez demasiado erótico deste livro - o amor e a perda, sempre a perda.
Terá sido dos primeiros livros que Murakami escreveu, e por isso não será dos meus preferidos, mas é de facto um livro sentido, profundo, melancólico - aqui sim, muito ao seu estilo.
As personagens são sempre densas, sempre estranhas, quase incompreensíveis.
Aqui se fala da morte e do suicídio com alguma naturalidade, aqui se narra uma história triste, de caminhos que se cruzam e se separam, de escolhas que se fazem.

terça-feira, abril 20, 2010

Sobre a morte

Aprendera algo com a morte do Kisuki e acreditara que transformara esse facto numa parte de mim sob a forma de uma filosofia: "A morte existe, não como o contrário da vida mas como parte dela".
Nutrimos a morte enquanto vivemos as nossas vidas. Por mais verdadeiro que isto fosse, era apenas uma das verdades que tínhamos de aprender. Foi isto que aprendi com a morte da Naoko: nenhuma verdade consegue curar a tristeza que sentimos com a perda de um ente amado. Nenhuma verdade, nenhuma sinceridade, nenhuma força, nenhuma generosidade consegue curar essa mágoa. Tudo o que podemos fazer, é suportar essa tristeza que se abate sobre nós sem prévio aviso. Concentrava-me nesses pensamentos dia após dia, ouvindo as ondas à noite e escutando o som do vento.  

Haruki Murakami "Norwegian Wood"

quarta-feira, abril 14, 2010

Na Pública, a 11 de Abril

Reportagem "Eles são católicos, homossexuais e praticam" - uma série de testemunhos de homossexuais católicos

Que espera então desta Igreja que é a sua, mas não o aceita na prática?
Tem de voltar às suas origens, à pessoa de Jesus Cristo. Tem de deixar de ser a Igreja da moral para ser a Igreja do amor. Uma Igreja que está agarrada ao supérfluo e não ao essencial não pode ajudar o ser humano. Está tão centrada na norma que se esquece das pessoas. Jesus olhou para cada um como um caminho a ser construído. A perfeição está no amor e não na moral. A perfeição não é uma família heterossexual com filhos. Quando há amor, uma relação hetero é boa e uma relação homo é boa.


Fala-se de sentimentos, aceitação, solidão. Testemunha-se o sofrimento de quem não é aceite, apesar da Fé.

(Não penso que seja uma reportagem extraodinária, mas vale a pena ler. Apenas uma ressalva: a Igreja "propõe" o celibato a todos os que não são casados, não apenas aos homossexuais por o serem.)

segunda-feira, abril 12, 2010

Se cuidas de mim, Tiago Bettencourt e Mantha





Se cuidas de mim eu…
eu cuido de ti também
Dentro da minha mão
eu guardo-te bem

Se amarmos do principio
se perdermos tudo outra vez
vou marcar-te bem
como um sonho vão
dentro da minha mão

Se cuidas de mim
eu cuido de ti também
Se vens em paz
eu venho por bem

Se formos bebendo o chão deste caminho
vou guardar-te bem
agora que sei
que não vou sozinho.
por isso vem…

Há uma praia depois sombra
uma clareira para iluminar
Há um abrigo no meio das ondas
tudo é caminho para iluminar
Por isso vem.

sexta-feira, abril 09, 2010

Sobre a (óbvia) Constitucionalidade do Casamento Homossexual

Estes apelos inúteis [referendar a lei] são os últimos cartuchos de uma resistência à igualdade. Sempre assim foi quando ela foi conseguida. Também os houve quando as mulheres ganharam o direito ao voto ou os negros conquistaram, nos Estados Unidos, os direitos cívicos que lhes estavam negados. Também eles prometeram o fim do Mundo e a decadência da civilização. E cá estamos.

 
Um dia a homofobia será vista com o mesmo desprezo com que a maioria hoje olha para o racismo. E só nesse dia pagaremos a dívida de séculos que temos para com os homossexuais. Nenhuma ditadura os poupou, quase nenhuma Igreja os tolerou, poucas democracias lhes fizeram justiça. Foram mortos, perseguidos, desprezados, apontados a dedo. O sofrimento que lhes causámos e que lhes continuamos a causar é de tal forma brutal, quotidiano e, por isso, banal, que demorará gerações a ser esquecido.
 Hoje começámos, como sociedade, a pedir-lhes desculpa. Um dia isto será apenas história. E olharemos para estes grupos que se mobilizam para impedir a felicidade alheia como grotescas memórias de um passado indigno. Aí sim, teremos acabado o que só agora começámos.

Daniel Oliveira, Texto na íntegra em expresso online (Negrito feito por mim)

quinta-feira, abril 08, 2010

Humor do caraças

Devias cultivar-te mais ler umas coisitas, não é livros grossos nem daquelas gaijas que são sobrinhas de um gaijo que queria ser socialista no "chilie" e no dia 11 de setembro de 1973 levou umas ameixas no bucho de um "sinhor" PInochet ( uma jóia de moço ) que pôs aquele país a andar
devias ler a Bola , o Record, a Maria , Novelas, Gina , etc., coisas q te cultivem...

By J.G.

Eu até nem ia escrever nada sobre o assunto...

... mas de facto não aguento. Definitivamente não é da minha natureza. Os jornais, os “opinion makers” deste tão belo país “à beira-mar plantado” já disseram muita coisa. Uns a favor, outros contra. Estou a falar dos prémios que António Mexia vai receber na EDP. Acho que anda tudo louco. Não, não sou fundamentalista. Sim, acho que os bons trabalhadores devem ser bem pagos. Sim, o mérito deve ser reconhecido. O problema é que não é nada disso que está em causa. A questão não é o facto de os prémios serem relativos a outros anos que não 2009 ou 2010 (até porque, se bem se lembram, a tão apregoada crise que serve de argumento para tudo, começou, na realidade, antes). A questão – ai, tão simples que é esta questão! – é que a EDP, ainda que seja uma empresa privada, é-o com capitais públicos: o Estado (todos nós?) é o maior accionista. O mesmo Estado que pede “sacrifícios” aos portugueses que, em média, ganham 10 vezes menos do que esse senhor. Esse senhor, em boa verdade, nem sequer tem legitimidade para abrir a boca em sua defesa: Terão que se assumir sacrifícios no curto prazo por forma a obter vantagens no médio prazo, devendo esta geração evitar carregar inutilmente as próximas. (in http://www.compromissoportugal.pt/).

Defendi que não devia haver aumentos nas circunstâncias em que estamos (correndo o risco de estar a ser profundamente injusta, aliás, sabendo eu que a minha circunstância não é necessariamente a circunstância do comum dos mortais). Defendi que devemos fazer sacrifícios - correndo o risco de ser acusada de demagógica porque efectivamente (sem complexos) faço muito poucos sacrifícios, ou pelo menos não preciso de fazer tantos. Defendo e defenderei sempre (assim o espero) que não há justiça social sem que haja o sacrifício maior de alguns - sendo certo que esses "alguns" não serão concerteza os que já são "sacrificados" por natureza.

Pois bem, não me calarei. Não aceito que uma empresa que detém o monopólio da electricidade em Portugal (e não me venham com a história de que já há concorrência, porque a mim ninguém me deu a escolher entre a EDP e outra empresa qualquer, espanhola ou chinesa) pratique dos preços mais altos da Europa. Não aceito - não aceitarei nunca! - que um "bom gestor", seja lá o que isso quer dizer, que apregoa constantemente que o Estado devia ser menos intervencionista, viva às custas dessa mesma (já pouca)intervenção.
Vão-se lixar com a conversa de que esse senhor pôs a EDP a ser cotada em Wall Street, que é um excelente gestor, que lailailailailai. Chegou lá como todos chegam e até nem é isso que é importante, porque não me interessa saber sequer o curriculum dele. Ontem ouvia um "opinion maker" dizer que Portugal "sofre" de inveja, não pode ver ninguém bem, isto a propósito do mesmo assunto e por considerar que se exagerou na "adjectivação" da situação. Pois bem, a invejosa, aqui, diz: OBSCENO, PORNOGRÁFICO, NOJENTO, INACEITÁVEL. E chamem-me invejosa quantas vezes quiserem.

segunda-feira, abril 05, 2010

A Ilha Debaixo do Mar, Isabel Allende





Zarité, uma escrava que sonha com a Liberdade. Um romance passado entre os séculos XVIII e XIX, onde tudo vai acontecendo à volta da família Valmorain. Zarité é a narradora, a personagem mais complexa e mais intensa do romance. São vários os espaços onde decorre a acção, desde a inevitável África, a “fonte” dos escravos, à Europa, Saint-Domingue, Cuba e EUA. A fraqueza humana, a bondade de uns no meio da crueldade generalizada. Bastardos, tragédias e, no meio do caos, muito amor que consegue ultrapassar tudo, mesmo aquilo que achamos ser impossível ultrapassar: a morte de um filho.